O Brasil gastou com a folha de pagamentos dos servidores públicos 3,5 vezes mais do que com a saúde e o dobro do que com educação, aponta diagnóstico do Instituto Millenium que lança nesta segunda-feira, 10, a campanha “Destrava” para pressionar pela aprovação da reforma administrativa, que prevê uma reestruturação do chamado RH do Estado, até o fim do ano pelo Congresso.
Em 2019, foram desembolsados R$ 928 bilhões para
pagar servidores públicos federais, estaduais e municipais, as três esferas do
Poder, o equivalente a 13,7% do Produto Interno Bruto (PIB). Enquanto os gastos
com saúde somaram 3,9% do PIB, a educação recebeu 6% do PIB, de acordo com os
cálculos do instituto.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, chegou a
anunciar, no início do ano, que a proposta estava pronta, mas o presidente Jair
Bolsonaro engavetou o texto e desistiu de encaminhá-lo ao Congresso, após
pressão do funcionalismo e parlamentares com vínculo com servidores.
Entre as mudanças que a equipe econômica propôs
estavam a redução no número de carreiras, que ultrapassa 300, e a restrição da
estabilidade para os novos servidores a apenas algumas carreiras de Estado,
depois de dez anos de estágio probatório.
O Millenium, um think tank (centro de
pensamento) brasileiro de inspiração liberal, traçou uma radiografia do
desempenho e da eficiência dos servidores públicos no País, em parceria com a
consultoria de Data Science ODX.
O estudo, ao qual o jornal O Estado de S. Paulo
teve acesso, foi feito com uso de tecnologias de inteligência artificial e técnicas
de análise de big data (capacidade de retirar valor de uma grande quantidade de
dados em velocidade rápida).
Analisa os encargos da máquina pública com
pessoal nos últimos 30 anos, os impactos do engessamento orçamentário com
pessoal e o grau de urgência da reforma administrativa.
A apresentação da proposta de reforma
administrativa é considerada uma prerrogativa exclusiva do Executivo. Ao jornal
O Estado de S. Paulo, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), cobrou do
governo a proposta para que a Casa possa começar a discutir o texto para se
evitar uma “gambiarra fiscal” nesse momento de crise.
Dreno
“O gasto com pessoal drena recursos, que
iriam para os investimentos públicos e pressiona a dívida pública, que
permanece com viés de alta, mesmo com a inflação e a taxa básica de juros
controladas”, diz Priscila Pereira Pinto, presidente do Instituto
Millenium.
Segundo Priscila, o instituto decidiu encabeçar
a campanha porque, com a crise econômica provocada pela covid-19, o Estado
brasileiro “está quebrando” e recolhendo cada vez menos impostos Na
sua avaliação, não adianta pensar somente em reforma tributária e
privatizações. “O Millenium acha importante voltarmos a pressionar o
governo tanto o Executivo como o Legislativo a retomar a conversa da reforma
administrativa”, diz
Ela alerta que o gasto com o funcionalismo vem
aumentando e não houve corte no meio da pandemia, enquanto os trabalhadores do
setor privado sofreram muito.
Segundo dados oficiais do governo, 9,5 milhões
de trabalhadores tiveram o contrato suspenso ou o salário reduzido por causa
dos efeitos da covid-19.
A taxa oficial de desemprego no País subiu para
13,3% no trimestre encerrado em junho, atingindo 12,8 milhões de pessoas, com o
fechamento de 8,9 milhões de postos de trabalho em apenas três meses em meio
aos impactos da pandemia.
Pelo diagnóstico do instituto, dos 63,7 milhões
de brasileiros que compõem a população ocupada, estima-se que 11,4 milhões
tenham algum tipo de vínculo empregatício direto com o setor público (entre os
celetistas mais estatutários).
Hoje, os servidores estatutários têm direito à
estabilidade após três anos de efetivo exercício, desde que aprovados em
avaliação de desempenho. Quem faz concurso para empresas e sociedades de
economia mista é chamado de empregado público e está submetido ao regime
jurídico estabelecido pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
O funcionalismo é composto por 9,77 milhões de
servidores, 21% dos 46 milhões de postos formais existentes hoje no País.
Funcionalismo integra o grup dos 6% mais ricos
O levantamento mostra que o patamar médio de salários do funcionalismo público federal coloca seus servidores no grupo dos 6% mais ricos, portanto, menos expostos à chamada regressividade do sistema tributário brasileiro (quadro que evidencia que quem ganha mais paga proporcionalmente menos impostos).
A crítica é que essa situação faz com que as atuais regras do serviço público
atuem como um distribuidor de renda às avessas.
Só em 2019, os mais de 605 mil funcionários federais civis, por exemplo,
custaram R$ 319 bilhões de reais, 21 vezes mais do que os recursos investidos
em saneamento no País.