‘Não é porque você é mulher que é mais frágil’

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Lucy Tamborino

Em algumas profissões, a predominância de homens é comum. As mulheres que se arriscam a atuar nessas carreiras ainda precisam lidar com o preconceito. Um desses casos é presença feminina nas polícias. Em todo Estado de São Paulo há atuando 2.512 delegados, sendo que apenas 513 são do sexo feminino.

Neste universo está a titular da Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) de Guarulhos, Luciana Lopes dos Anjos. Em entrevista exclusiva para a Folha Metropolitana a profissional contou sobre sua trajetória, além dos desafios na profissão.

Ela está há 11 anos como delegada, com passagens por diversos Distritos Policiais (DPs) e acredita que a caminhada é fruto de dedicação e amor pela profissão. Sem perder a feminilidade, mas com pulso firme, Luciana já comandou equipes com diversos homens e, muitas vezes, até mais velhos que ela. A profissional lida diariamente com os diversos casos de violência contra a mulher que chegam à delegacia especializada que há na cidade.

A delegada abrirá a série de entrevistas especiais que o jornal publicará durante todo o mês de março, em celebração ao Dia Internacional da Mulher. Foram ouvidas personalidades que se destacam e fazem a diferença em suas profissões, atitudes e histórias de vida.

Abaixo os principais pontos desta entrevista que pode ser conferida na íntegra no site www.fmetropolitana.com.br.

Folha Metropolitana – Como você iniciou a sua carreira na Polícia Civil?

Luciana Lopes dos Anjos Granato Xavier – Iniciei como escrivã de polícia aos 19 anos, seguindo os passos da minha irmã mais velha que já atuava na função. Às vezes eu passava na delegacia para vê-la e gostava daquele ambiente. Aos 17 anos comecei a estudar para o concurso de escrivã.

Qual a primeira delegacia que você atuou?

Eu entrei como escrivã na delegacia de Mairiporã e infelizmente ocorreu o falecimento da minha mãe. Ela tinha um comércio e eu acabei saindo da polícia para assumi-lo. Nessa época eu estava na faculdade de Direito, porque a minha intenção já era ser delegada.

E como foi sua trajetória até se tornar delegada?

Após a conclusão da faculdade eu comecei a advogar. Mas não era o que eu queria. Eu tenho muito respeito pela advocacia, mas eu não era apaixonada. Eu advoguei por sete anos na área civil, família e um pouco na trabalhista. A polícia estava no sangue e eu queria voltar. Então prestei concurso para delegada e graças a Deus eu passei. Em janeiro fez 11 anos que eu sou delegada de polícia. É paixão mesmo, é você gostar e ser apaixonada pelo que faz.

Como é atuar na profissão que predominantemente é ocupada por homens?

Eu não sei se é porque eu já acostumei, mas quando tem a reunião dos titulares de Guarulhos, nós somos em torno de 16 e eu sou a única mulher. Para mim é comum. Eu não enfrentei preconceito dos colegas, mas na delegacia sim. Quando algum cidadão procurava o delegado e quem surgia era eu, em muitos casos, ele perguntava pelo delegado novamente esperando um homem. Nesse momento eu respondia eu sou a delegada.  Então você acaba tendo preconceito da população.

Você encontrou alguma resistência da equipe?

Sim, mas você precisa se impor. Não é porque você é mulher que é mais frágil.  Você está ali de igual para igual. Temos um jargão, meio que uma brincadeira, de falar que polícia não tem sexo. Eu nunca fui desrespeitada.

Quais foram os desafios que enfrentou?

Quando eu participei do concurso eram 23 mil candidatos para 120 vagas. Porém, eu acredito que o mais difícil até hoje não foi passar no concurso, porque todos os dias há um novo desafio. Em cada ocorrência você lida com a liberdade e a vida das pessoas. Às vezes uma mulher vem a delegacia e diz que está sendo perseguida, eu preciso analisar se é um caso de prisão ou não. Tem o risco de o autor matar. Então é um desafio todos os dias.

Como é liderar uma equipe?

Você tem que ter pulso firme e certeza das suas decisões. Eu não sou a dona da verdade, aqui nós somos uma equipe, então muitas vezes converso com a escrivã-chefe, com a investigadora-chefe e, quando eu estava no plantão, com as componentes da equipe.  A decisão é sua no final das contas. Quem tem que tomar decisão é você. Quem assina é você. Se der alguma coisa errada e alguém tiver que responder vai ser você também.

É uma responsabilidade grande.

Na sua grande maioria eu que decido sobre a liberdade das pessoas. Se eu prendo ou não. É uma responsabilidade muito grande às vezes você ter algumas evidências, mas não todas e a pessoa ser inocente e você colocar na cadeia ou você deixar um criminoso solto. Então, eu todos os dias peço para Deus em minhas orações para não me deixar cometer injustiças.

Como você concilia ser delegada com o seu dia a dia?

Tenho que chegar em casa e colocar um sorriso no rosto.Eu não comento o que acontece aqui diariamente. Eu não posso ser delegada 24h por dia. Eu tenho que ter jogo de cintura.

Você recomendaria a profissão para outras mulheres?

Com certeza! Eu sou suspeita porque sou apaixonada pelo que faço. É uma profissão gratificante e que demanda muito estudo, mas não é impossível de se conseguir. A carreira traz admiração. Quando estou fora do meu ambiente de trabalho e alguém me pergunta o que faço, a pessoa diz que eu não tenho cara de delegada de polícia. A população tem uma noção de uma mulher embrutecida, mas não é assim. Continuamos femininas. Mas, como mulher, você precisa ter pulso firme. A profissão te exige.

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