Dos 15
livros mais vendidos no Brasil de 23 de março até 12 de julho, durante a
quarentena, 10 são de autoajuda, sobretudo financeira, dois são de ficção –
ambos de George Orwell -, apenas três foram escritos por mulheres, dois são de
brasileiros e só um é recente, do fim de 2019: Pequeno Manual Antirracista, de
Djamila Ribeiro, cujas vendas foram influenciadas também pelos debates e
protestos que se seguiram ao assassinato de George Floyd. O ranking foi feito
pela Nielsen a pedido do Estadão e mostra o brasileiro Thiago Nigro no topo,
com Do Mil ao Milhão Sem Cortar o Cafezinho.
“Thiago é um fenômeno, todos escutam o que
ele fala. Ele citou dois livros antigos e vimos as vendas deles aumentarem
também”, diz Daniela Kfuri, diretora de Marketing e Vendas da HarperCollins
Brasil referindo-se aos títulos O Homem Mais Rico da Babilônia, que vende duas
vezes mais agora e o 7º no ranking, e O Investidor Inteligente, o 15º.
Do Mil ao Milhão, de 2018, foi o terceiro livro
mais vendido do ano passado e não é o único daquela lista a continuar com uma
boa performance. A Sutil Arte de Ligar o F*da-se, o best-seller de 2018 e de
2019, está na segunda posição. Os Segredos da Mente Milionária, Pai Rico, Pai
Pobre, O Poder do Hábito, Mindset, O Milagre da Manhã também seguem entre os
mais vendidos, afinal, não é de hoje que estamos cansados e querendo melhorar
alguma coisa – a conta bancária, o ânimo diante da vida e de suas adversidades
-, desejos acentuados em tempo de incertezas.
“Na pandemia, a busca por esse tipo de livro
expandiu ainda mais As pessoas estão preocupadas com a crise, o emprego,
querendo entender melhor como se relacionar com seus ganhos”, comenta
Daniela. Nesse período, a HarperCollins, como a maioria das editoras, diminuiu
drasticamente o número de lançamentos. Entre abril e junho, só fez lançamentos
digitais, já que as livrarias físicas são essenciais para a divulgação de um
livro. Um ponto a se comemorar foi que as vendas de e-books aumentaram, para a
editora, pelo menos 40%. No início da pandemia, ela lembra, foram feitas até
campanhas para incentivar esse tipo de leitura
Algo assim também aconteceu com a Sextante. Numa
situação normal, ela teria lançado 50 livros, mas não fez mais do que 20, todos
físicos, na quarentena. “Mas o e-book está indo muito bem mesmo e tivemos
um crescimento expressivo, da ordem de 60%”, destaca Marcos da Veiga
Pereira, sócio da Sextante e presidente do Sindicato Nacional de Editores de
Livros (Snel).
Pereira comenta ainda que a venda de livros
digitais é muito influenciada pelo preço e a editora passou a ter uma atitude
mais proativa e promocional com relação a eles. Além do preço (o valor indicado
na lista ao lado é o de tabela, sem os atuais descontos), o que contribuiu para
seu crescimento foi a praticidade num momento em que as livrarias estavam
fechadas e começando a lidar com outras formas de venda, quase sempre menos
ágeis do que um leitor ansioso gostaria. “A facilidade de entrega do
produto é imensa. Cinco minutos depois da compra, já é possível ler.”
O e-book e o e-commerce deram uma movimentada
nas vendas de março para cá, e ajudaram o mercado editorial a segurar um pouco
as pontas. Mas a recente reabertura das livrarias físicas, dentro do plano de
flexibilização do combate ao coronavírus, trouxe um novo, ainda que desconfiado
– já que há sempre o risco de voltar a fechar -, ânimo para o setor, que viu
suas vendas crescerem ligeiramente.
Entre 15 de junho e 12 de julho, período mais
recente analisado pelo Painel do Varejo de Livros, que Nielsen e Snel anunciam
hoje, foram comercializados 2,95 milhões de exemplares, com faturamento de R$
117,08 milhões – os melhores índices da quarentena e um aumento de 0,64% em
volume e de 4,44% em valor, em comparação com o mesmo período de 2019. Para se
ter uma ideia, entre 23 de março e 19 de abril, o começo do isolamento, foi
vendido 1,58 milhões de cópias e o faturamento ficou em R$ 65,6 milhões – uma
queda de cerca de 45% com relação ao ano anterior. Os números foram melhorando
aos poucos. Entre abril e maio, o mercado vendeu 2,05 milhões de exemplares e
faturou R$ 82,99 milhões. Entre maio e junho, foram 2,7 milhões de cópias e R$
109,03 milhões de faturamento. Apesar disso, a perda acumulada em 2020 é de
10,5% em volume e de 9,8% em valor. O levantamento não considera e-book.
“Consumidores e mercado editorial andaram
perdidos nas primeiras semanas. Houve desencontro entre o que o cliente queria
e o que mercado tinha a oferecer, mas rapidamente os varejistas começaram a
encontrar caminhos. Nesse período, os leitores preferiram comprar literatura de
entretenimento (ficção e não ficção comercial), com destaque para literatura
estrangeira, que cresceu 2%”, afirma Ismael Borges, coordenador do
Bookscan, da Nielsen.
O editor Emilio Fraia, da Companhia das Letras,
credita a redescoberta de 1984 e de A Revolução dos Bichos, obras de George
Orwell dos anos 1940 e as duas únicas ficções no top 15, ao debate sobre as
fake news. “Orwell acreditava que, se não fosse combatido, o totalitarismo
poderia triunfar em qualquer parte. E hoje nós o lemos também em busca de suas
reflexões sobre o apagamento da verdade.”
Livros de autoajuda pessoal e financeira dominam o ranking da quarentena
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