Guarulhos discute abolição inacabada com representante do Ministério da Igualdade Racial e especialistas

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O seminário 135 Anos da Abolição Inacabada: Perspectivas das Políticas de Reparação, promovido pela Prefeitura de Guarulhos, reuniu um público de 300 pessoas, entre professores, servidores e população em geral, nesta quarta-feira (17) no Salão de Artes do Adamastor. O objetivo do encontro foi abordar os efeitos da abolição inacabada para a população negra, apresentar possibilidades para o aperfeiçoamento de políticas públicas e privadas na superação das desigualdades e no enfrentamento do racismo a partir da valorização da história e da memória afro-brasileira.

 “Como vice-prefeito, professor e negro da periferia quero fazer uma reflexão. O negro é símbolo de resistência, muitas vezes são pessoas invisíveis. Posso dizer de cátedra porque já passei por situações de preconceito. Vivemos o racismo estrutural no país. Nossa luta é contínua, de conscientização e de enfrentamento para que possamos ter um olhar mais humanizado”, afirmou o vice-prefeito, Professor Jesus.

Por sua vez, o secretário de Direitos Humanos de Guarulhos, Abdo Mazloum, falou da importância do combate às desigualdades. “Temos que agir e combater todas as formas de preconceito e intolerância racial, religiosa e de gênero. Temos muito trabalho a fazer para diminuir as desigualdades”, disse.

O trabalho intersetorial da Subsecretaria de Igualdade Racial foi destacado pela titular da pasta, Andreia de Andrade. “A política da igualdade racial é transversal. Em tese aperfeiçoamos o olhar de todas as outras políticas públicas para o que é específico. Nosso sonho, enquanto gestão de política de igualdade racial, é que todas as secretarias municipais tenham um setor que cuide da diversidade e da inclusão para uma sociedade melhor”, ressaltou.

A presidente do Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial (Compir), Luiza Owhoka, lembrou o racismo diário enfrentado pela população negra. “As pessoas pretas fazem a luta desde o primeiro choro. Precisamos refletir sobre o que é ser preto numa terra que nega a existência do racismo, ainda sabendo que ele existe e desconstrói na cabeça do ser humano preto. Precisamos batalhar, sobretudo na educação, para mudar isso e para que a gente possa existir e não apenas sobreviver”, disse.

Antirracismo na educação

O tráfico de negros e a escravidão produziram uma visão distorcida do continente africano, segundo o filósofo e professor Lauro Cornélio da Rocha. “Só se justifica o racismo pelo desconhecimento da África, que era um continente com vários impérios, reinos, culturas diversas e organizações sociais distintas, como o império europeu. Criou-se a ideia de um povo animalizado que transformou pessoas em mercadorias”, disse o pedagogo, que é coordenador pedagógico da Prefeitura de São Paulo.

De acordo com Lauro, a mentalidade escravista passou pelo século XIX, quando foram elaboradas as leis abolicionistas, e se perpetua até hoje. “Há necessidade da desconstrução dessa animalização do povo africano. A educação tem a tarefa fundamental de fazer isso e auxiliar na construção de um mundo diferente para todos”, explicou o coordenador.

Já o historiador e doutorando em educação Carlos Eduardo Dias Machado refletiu sobre as práticas escolares adotadas nas escolas a partir da origem da humanidade na África, há cerca de 300 mil anos, quando foram encontrados os restos mortais do primeiro Homo sapiens no Marrocos. “O primeiro ser humano era negro. A origem da nossa espécie é um homem negro e seu corpo foi reconstituído em laboratório. Sua pele, cabelos e olhos eram escuros para proteger da radiação solar, uma vez que vivia em uma região tropical.

A origem de nossa espécie, segundo Machado, é fundamental para entender que não há raça pura. “O Homo sapiens evoluiu no continente africano e migrou para outros continentes. Há 290 mil anos todos os seres humanos eram negros. O mais antigo europeu era negro”, explicou o professor, que abordou também a resistência à escravidão, o racismo institucional e interpessoal, políticas afirmativas e o movimento negro, no qual milita desde 1988.

Desigualdades raciais e políticas afirmativas

O panorama das desigualdades raciais e o impacto das ações afirmativas foram tratados pela diretora do Ministério da Igualdade Racial do governo federal, Tatiana Dias. Ela discorreu sobre os desafios na implementação de políticas de igualdade racial, as quais devem ter caráter estruturante, de transversalidade e interseccionalidade.

Por fim, o jornalista Antonio Pita, criador da startup de turismo e cultura negra Diáspora Black, abordou o turismo afro como forma de promover a conexão dos visitantes às experiências afro centradas em cada destino, ativando a economia criativa local de protagonismo negro, além de valorizar as identidades e as memórias sociais negras e fomentar a preservação do patrimônio material e imaterial da população negra.

Pita apresentou ainda o site Diáspora Black, a principal plataforma de turismo e cultura negra da América latina, criada em 2016 e que está em mais de 145 cidades.

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