De repente, o celular toca. Numa mensagem de WhatsApp, um amigo pede
ajuda. Precisa fazer um depósito urgente e está com problema no aplicativo do
banco. Pergunta se pode fazer para ele e no dia seguinte devolve o dinheiro. A
história faz parte de um dos golpes mais populares dos últimos meses, sobretudo
durante a quarentena. Com mais pessoas em casa por causa do isolamento social e
aumento de operações no comércio eletrônico, as tentativas de fraudes virtuais
estão em alta.
No período entre 20 de março e 18 de maio, a busca de informações pessoais e
bancárias de brasileiros na chamada dark web (ver infográfico) cresceu 108%,
segundo pesquisa feita pela Refinaria de Dados, empresa especializada na coleta
e análise de informações digitais. O número de buscas diárias alcançou 19,2
milhões ante 9 milhões no período pré-covid.
O sócio da companhia, Gregório Gomes, responsável pelo trabalho, explica que
normalmente quem rouba os dados pessoais das pessoas não é quem aplica o golpe.
Eles conseguem um banco de dados e vendem para criminosos na dark web.
“São sempre dois atores diferentes, o que dificulta a ação da
polícia”, afirma o executivo.
Outro dado que corrobora o aumento das tentativas de golpes virtuais é o
crescimento dos chamados phishings, nome dado a prática que usa e-mail ou SMS
para roubar informações do usuário Segundo informações da Federação Brasileira
de Bancos (Febraban), o número de phishings aumentou 70% no pós-covid. Neste
caso, os criminosos enviam mensagens com informações que chamam a atenção do
usuário, que clica em um link e, a partir daí, permite a captura dos dados
pessoais.
Mensagens fraudulentas
Durante o isolamento social, as mensagens feitas pelos criminosos para atrair a
atenção dos brasileiros quase sempre mencionavam as palavras covid, auxílio e
Caixa – expressões que mais cresceram no período. Cerca de 39% das mensagens tinham
a palavra covid; 36%, auxílio; e 33%, Caixa (ver gráfico). “Das tentativas
de phishing no Brasil, 73% dos disparos foram feitos por SMS”, diz Gomes.
Segundo ele, boa parte dos dados conseguidos nessas ações é vendida em sites da
dark web. O que explica a reativação de mais de 250 marketplaces ilegais nesse
submundo da internet. O executivo explica que vários sites haviam sido fechados
anteriormente por ações da polícia, mas agora voltaram a atuar.
O diretor da comissão de Prevenção a Fraudes da Febraban, Adriano Volpini,
afirma que 70% das fraudes têm origem na engenharia social. “Os criminosos
sabem que é difícil transpor os mecanismos de segurança. Então eles se valem de
formas para conseguir que as pessoas passem os dados para eles.” Com mais
pessoas em casa e online, eles criam páginas falsas e capturam as informações.
Um golpe comum, diz ele, é alguém ligar perguntando se a pessoa fez uma compra
num determinado valor. Diante da negativa do usuário, ele afirma que é do banco
e pede para confirmar os dados. Ele informa alguns e pede outros. “São
golpes que parecem simples, mas muita gente cai.” Portanto, afirma o
executivo, desconfie de promoções mirabolantes, promessas muito fora da
realidade e não clique em links suspeitos. Além disso, os bancos não pedem para
digitar ou informar senhas.
Comum
Segundo o delegado Carlos Ruiz, da 4ª Delegacia de Delitos Cometidos por Meios
Eletrônicos (DIG/DEIC), as fraudes mais comuns têm sido os leilões virtuais de
automóveis, em que criam sites falsos, vendem o carro e desaparecem; a clonagem
de WhatsApp; e o roubo de perfil de redes sociais, usados também para ameaçar e
extorquir seguidores.
Para Daniel Marchetti, da Associação Brasileira das Empresas de Cartão de
Crédito e Serviços (Abecs), a rápida mudança no comportamento de gastos do
brasileiro durante a pandemia fez com que os fraudadores se aproveitassem do
momento.
Segundo ele, diante desse novo cenário, as instituições mudaram suas
estratégias internas para evitar os golpes e intensificaram as ações de comunicação
com os clientes.
Em nota, a Caixa afirma que não envia e-mails ou mensagens pedindo informações
e nem realiza ligações para os cidadãos. Também diz que não manda SMS com link.
“Pela primeira vez tive o meu cartão clonado”
Viviane Carmezim estava trabalhando em casa quando recebeu uma mensagem de
WhatsApp de um número novo, mas com a foto do filho e da neta. Na mensagem, a
pessoa falava que havia trocado o número e era para ela gravar esse novo.
Acreditando ser o filho, Viviane questionou por que havia mudado o número e a
pessoa explicou que havia conseguido um plano melhor. Conversa vai, conversa
vem, a pessoa disse pra ela que por causa da troca do número estava com
problemas para acessar o aplicativo do banco e pediu para ela depositar um valor
de R$ 40 mil.
Viviane disse que só conseguiria fazer a metade do montante. Mas, achando
estranha a história, tentou ligar para o filho, que dizia não poder falar. Ela
imaginou que ele estava em alguma reunião de trabalho e acabou fazendo a
transação. Antes de dar o ok, enviou o montante e a conta para o fraudador, que
confirmou os números. Então, Viviane concluiu a transação.
Ao enviar o recibo para o filho, por equívoco, mandou para o celular do filho
(não o do fraudador). Imediatamente, o filho ligou para a mãe para entender o
que era aquele comprovante e disse que era um golpe. Viviane ficou desesperada,
afinal tinha transferido para um criminoso R$ 21 mil. “Dez minutos depois
de fazer a transferência, liguei para o banco e graças a deus consegui reverter
a transação. Mas foi muita sorte eu mandar o recibo para o celular correto do
meu filho.”
No caso da designer Pamela Bortolanza, a fraude ocorreu no cartão de crédito.
Três dias após usar o cartão num site de doação, recebeu uma mensagem de um gasto
de R$ 1,5 mil. No dia seguinte, outras despesas, como táxi e supermercado.
“Foi a primeira vez na vida que tive um cartão clonado. Sempre tive muito
cuidado.”
Na mesma semana que foi vítima do golpe, ela conta que seu ex-marido teve a
conta do WhatsApp clonado. O fraudador disparou mensagens para várias pessoas
pedindo dinheiro, mas não teve sucesso, diz ela.
Golpes virtuais disparam com covid-19
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