Em 38% das cidades só há candidato branco a prefeito

Fabio Nunes Teixeira/PMG
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A Bahia é o Estado brasileiro com o maior porcentual de cidadãos que se declaram pretos, 17%, e conta ainda com 60% da população se identificando como parda. Mas, nas eleições deste ano, em 33 das 417 cidades baianas, apenas candidatos brancos disputam cargos de prefeito. Essa exclusividade nas eleições para o Executivo é uma realidade ainda bastante significativa no conjunto de municípios do País – neste ano, ocorre em 2.134 cidades. Ou seja, 38% só têm candidatos brancos, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Esta é a terceira eleição (a segunda municipal) em que o tribunal divulga dados sobre a raça dos candidatos. Em 2016, o número de cidades sem candidatos negros era ainda maior: 2.512 municípios, ou 45%. Mesmo onde não há exclusividade, os brancos ainda são em maior número, uma vez que, ao todo, 63% dos candidatos a prefeito se declaram assim. É um contraste em relação ao total da população do Brasil. Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar (Pnad) 2019, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 42% dos 209 milhões de brasileiros são brancos, 46,8% são pardos e 9,4%, pretos.

Uma das explicações para o cenário é uma dificuldade maior entre os candidatos negros em viabilizar financeiramente suas candidaturas, segundo especialistas. Outra é o fato de as cúpulas dos partidos políticos serem dominadas por homens brancos.

Neste ano, há previsão legal de que os partidos têm de distribuir proporcionalmente suas partes do fundo eleitoral por raça, de forma que, se a legenda tem 10% dos candidatos negros, eles receberão 10% da verba do fundo. Essa regra, no entanto, não vale para candidatos a prefeito, só para vereadores.

Embora as receitas das candidaturas ainda estejam sendo contabilizadas e os valores possam mudar até o dia 15, os dados preliminares do TSE mostram que, na média, um candidato branco tem R$ 69 mil para sua campanha, enquanto o negro, ou a soma de pretos e pardos, tem R$ 63 mil.

Progresso

Apesar da desproporcionalidade, o sociólogo José Vicente, reitor da Faculdade Zumbi dos Palmares, vê avanços na presença dos negros no processo eleitoral. “Você ainda não está na estrutura dos partidos, mas os negros estão na base, na militância e também entre os candidatos a vereador e a deputado estadual, principalmente. Mas o que ficou aquém e além é o acesso a esses espaços privilegiados de poder mais hermético e efetivo, que são os cargos majoritários”, afirma.

Ele destaca, por outro lado, que o fato de o candidato ser negro não tem relação com obter uma votação mais ampla entre o eleitorado que também se vê assim. “Tem mais questões ligadas à decisão do voto.”

O professor de Sociologia e Ciência Política do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP-UERJ) Luiz Augusto Campos acha “precipitado imputar ao eleitor o fato de não termos candidatos negros” e destaca que a regra de proporcionalidade racial nas eleições deste ano, definida pelo TSE, só vale para a disputa no Legislativo. “Não tem cota, até porque é um candidato de cada partido por cidade”, observou.

Em São Paulo, há dois candidatos negros: Orlando Silva (PCdoB) e Vera Lúcia (PSTU) entre um total de 14 nomes que se lançaram na disputa. Silva também cita a falta de recursos como principal barreira. “Para você disputar um cargo majoritário, quase sempre você passa por alguma experiência política anterior. Se nós nem disputamos os cargos proporcionais, vereador e deputado estadual e federal, mais difícil ainda é você disputar cargos majoritários.”

Uma das cidades só com candidatos brancos é a vizinha São Caetano do Sul, no ABC. Candidato à reeleição, o prefeito José Auricchio (PSDB) afirma que nunca disputou eleições contra candidatos negros (já foi prefeito três vezes). “Só posso atribuir isso ao racismo estrutural que temos no País”, disse. “A democracia vive da representatividade. Quanto maior ela for, melhor.” 

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